sexta-feira, 31 de julho de 2009

O cinza de todas as coisas


Chovia, mais uma vez. Daqui a pouco não é mais necessário avisar. Chove sempre. Hoje (chove) andei (chove) pela rua (chove). Quando andei e quando escrevo (chove). As palavras são chuva fina e é preciso uma miríade delas pra de fato se molhar. Se o que se quer é se molhar, porque não raro encontro um e outro que escolhe passa-tempo alternativo: esperar passar. Mas há uma verdade que estilhaça: a gente nunca só espera passar. Chove na espera como chove na rua em que andei, e hoje, e sempre.
Então o que temos é que chovia (e que choveu, e que chove), o que não confere nada de extraordinário ao que pretendo relatar, já que, conforme subescrito, só o que esse céu faz é chover (ontem, e hoje, e sempre). (E aqui). Chovia, mas não só chovia como também era fim de julho. Eis que algo finalmente, porque, hão de concordar, nem sempre é fim de julho. Consigo vislumbrar até começos de julhos, se forçar um pouco. E sei que existem meses que não são julho, mas anda difícil acreditar em outros tempos que não esses.
Aprendi jovem: nem tudo precisa de tempo e espaço. Essas minhas coisas precisam, por exemplo, só de tempo. Onde chove e é quase outro mês. Se esse fim salvaguardasse embaixo do braço uma promessa! Mas acho que é só fim mesmo, e o começo só começa quando começa.
(Um sobressalto de lucidez manifesto em parágrafo próximo:)
"Peremptório" e "Peripatético" são verdadeiras enxurradas. Queiram me desculpar. A errata: Palavras não são sempre chuvas finas. São todas tempestades em pontencial. Corre a boca pequena, nada assim oficial, de que algumas até ventam. Se pedirem, não fui eu quem falei. Segredo nosso.
Essa chuva esvazia, não esvazia? Se não fizesse tanto frio nessa cidade. Vejo os rostos na rua e sei que compartilhamos algo desolador: fomos todos obrigados a ver o cinza de todas as coisas. E ao ver o cinza, às vezes é melhor fechar os olhos. Não condeno.
Ao fim e ao cabo, fico com nada. E vos deixo com nada. A "coisa" que eu prentendia relatar não precisa de espaço, e agora enxergo: nem mesmo a própria coisa é necessária. Só precisava de tempo. Só era tempo.
Chove, ainda.

16 comentários:

Anônimo disse...

Oi Nataly, muito obrigado por dua visita lá no temporário, e também por seus elogias e pela perfeita compreemsão do txt. Adoro seus textos e neste adorei sua tentativa de dar um significado às coisas através das cores, cheiros, numa perspectiva diferente. Gostei demais desse trecho:

"Peremptório" e "Peripatético" são verdadeiras enxurradas. Queiram me desculpar. A errata: Palavras não são sempre chuvas finas. São todas tempestades em pontencial. Corre a boca pequena, nada assim oficial, de que algumas até ventam. Se pedirem, não fui eu quem falei. Segredo nosso.

Perfeito! Lindo! Beijos!

Renan Barreto disse...

Nataly, quando eu leio seus textos me dá algo estranho dentro de mim que só se sente quando se está apaixonado. Não sei o que é, é realmente dificil de dizer. Como eu gosto de lê-la, ler alguém é a melhor forma de enterder o caráter da pessoa, e o seu, minha amiga, é puro. E chove chuva lá fora também, digo, fora de fora da minha casa e não só perto da sua. Ai ai ai o cinza, que corzinha mais sem graça. Gosto é de vermelho, azul, verde e amarelo!

Prefiro o meu céu azul com algumas nuves, por que não? É bom vê-las voando como naves que não tem direção.

BJÃO! E escreva quando quiser, quando sentir...

At disse...

Muuuuito bom :D

belissimo texto,
to maravilhado :D


muito bom :D
parabens pelo blog :*

Jaime Guimarães disse...

( você pode nem acreditar, mas vou falar assim mesmo: acessei seu blog, começou a chover por aqui. Sério)

Mas por aqui há também uma chuva muito forte. Talvez passe logo, talvez demore um pouco mais. Espero por um céu azul. Que eu posso pintar, sei disso. Mas é tão bonito quando todos veem este mesmo céu - apesar de saber que é impossível.

Trilhas: waiting for the sun/riders on the storm, de um tal Jim.

Bjs, Nataly!

Ana Stumpf Mitchell disse...

pois sabe que eu nunca vejo o verde tão verde quanto num dia de chuva? vejo as cores cinzas quando chove por dentro, quando a chuva é salgada...

é sempre bom "te ler"!!
besitos!!
=]

Fox Mulder disse...

Nada contra essa chuva, nem contra os sentimentos que ela traz; Afinal, se não existisse cinza as outras cores acabariam por ser menos coloridas.
E aliás, final de julho é aquela época em que as chuvas começam, se alguém tiver por intenção esperar ela passar é melhor hibernar =)

ligiaferraz disse...

o que eu mais gosto dos teus textos é como de uma coisa tão cotidiana e que nos passa tão despercebidas, tu transforma na maior importancia do dia. cheia de detalhes e emoções que nos faz perceber de outra forma o que a vida toda vimos do mesmo jeito.
e chovendo lá fora ou não, o que mais me toca no teu texto que quando chove aqui dentro, e aí dentro. e aí me faltam palavras pra dizer o quanto gosto das coisas que tu escreve.

como sempre, tá lindo!
beijo, minha querida!!

-rayane- disse...

Que belo texto, uau!
Há tempos não veio por aqui tbm... belas palavras!
Queria Brasília cinza, só por hoje!
Abraços

Anônimo disse...

Adorei mesmo o seu texto, o jeito que você usa as palavras, apesar de triste ficou bastante liríco. Adorei a atenção aos sentimentos e aos detalhes, parabéns.

Valeu mesmo por ter passado no meu blog também... Vou passar aqui mais vezes viu! pode né?!
hehe

Bj

Ana Stumpf Mitchell disse...

e minha alma chove salgado por mais palavras tuas!!!!
beijos petulantes!
=]

Ana Karenina disse...

Sua chuva me molhou.

Adan Christian disse...

Comentando para diminuir a solidão deste pobre bloguinho.

Volte a escrever!

pedro disse...

Parou de chover! Sempre lembro da nossa video-instalação chic.
Saudades, né? Você foi a unica pessoa do mundo que leu meu blog não-divulgado.
Sonhei que estava em Capinzal esses dias (ou uma versão onírica-idealizada de Capinzal), e você tinha me obrigado a experimentar drogas num estacionamento. Lamento dizer que meus dias de Christiane F. acabaram há mais de dez anos. HAHA.

Beijos!

Ana Stumpf Mitchell disse...

teu blog pede água. eu sei, eu li. aliás, eu não li, porque agora não diz, embora diga muito a cada nova releitura.

é só saudade de te ler.

e aqui chove...
=]

Ana Stumpf Mitchell disse...

http://brasilianapoiesis.blogspot.com/2009/10/palavrices.html

pra ti
=]

Tatiane Trajano disse...

Molhei!